Moçambicanos apertam o cinto devido à subida dos preços

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Famílias de Maputo já levam menos compras para casa e começam a mudar de hábitos alimentares, como deixar a comida do jantar para o pequeno-almoço do dia seguinte, sem pão, devido à subida dos preços no país.

“Eu comprava sete a oito quilos de açúcar, mas hoje só comprei cinco, costumava comprar cinco dúzias de ovos, mas hoje só comprei quatro”, disse à Lusa uma mulher que aceitou identificar-se apenas por Rainha, arrumando no carro sacos de plásticos de compras que fez no mercado grossista do Zimpeto, em Maputo.

Em Março, Rainha comprou o favo de 24 ovos a 250 meticais (3,65 euros), mas hoje teve de pagar 275 meticais (quatro euros) pela mesma quantidade.

“Estes aumentos desprogramam tudo, quando é para fazer ´rancho` [compras do mês]”, afirmou a mulher, funcionária pública, casada e mãe de dois filhos.

A moçambicana não tem dúvidas de que se a escalada de preços continuar, “vai destruir famílias”, porque “haverá desentendimentos nas casas”.

Mussá Eusébio Bié aguarda no carro, enquanto a mulher faz compras no Zimpeto, mas assume que há dias em que o pequeno-almoço é com comida que ficou do jantar do dia anterior, porque não há dinheiro suficiente para pão.

“A vida está muito cara, as compras que fazíamos antes já não fazemos agora, todos sentem isso, usamos a comida do jantar para o mata-bicho”, relata Bié, enquanto entrega mais notas de meticais à mulher, para o reforço do orçamento familiar.

Lourenço Macuácuá, que vende batata e cebola importadas da África do Sul, observou que o movimento de clientes reduziu-se nas últimas semanas e o negócio vai mal.

“Um saco de batata [de 10 quilos] tinha de estar a 400 meticais (5,8 euros), mas vendemos a 360 meticais (5,25 euro) e 390 meticais (seis euros), porque os clientes não conseguem pagar mais, porque estão sem dinheiro”, declarou Lourenço Macuácuá.

“Em muitas ´machamabas` [campos agrícolas] na África do Sul, não estão a trabalhar, não há gente”, notou.

Com as inundações recentes no sudeste da África do Sul, maior economia do continente,  os proprietários dos campos agrícolas chegam a pedir aos compradores, por conta destes, para “arranjarem” trabalhadores para a colheita, o que agrava os custos, acrescentou.

A subida de preços de produtos básicos sente-se também nos supermercados de Maputo.

“Devolvi muita coisa na caixa de pagamento, porque o dinheiro já não chegava. O meu plano de compras foi desfeito”, disse à Lusa Sonita Ismael, quando saía de um supermercado de Maputo.

A maioria dos aumentos, prosseguiu, é de valores muito baixos por cada produto, mas tudo somado resulta em menor quantidade que se leva para casa.

“Quando os aumentos nos salários deste ano chegarem, já estarão engolidos pelos novos preços, a situação estão difíceis e teremos mais aumentos nos combustíveis, nos próximos dias”, afirmou a funcionária de uma universidade pública, em Maputo.

Carlos Enosse, dono de uma empresa de construção, narrou que está a pagar mais pela mesma quantidade de produtos que a sua família consome, admitindo que a situação está mais sufocante para as classes mais pobres.

“Não estou numa situação pior, porque tenho uma pequena empresa, mas as contas aumentaram para todos e pode ficar pior”, disse, enquanto mete na bagageira do automóvel as compras que acabava de fazer.

No início de Abril, o Banco de Moçambique antecipou uma “aceleração da inflação anual nos próximos meses”, para 6,61%, depois de 6,19% em Fevereiro, devido ao aumento dos preços dos combustíveis e dos alimentos em todo o mundo, decorrente da “escalada do conflito geopolítico na Europa”, numa alusão à guerra na Ucrânia, “e à ocorrência de desastres naturais na região centro e norte” de Moçambique, que provocaram prejuízos no primeiro trimestre.

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