Analistas falam em fim da acumulação primitiva no sector petrolífero
A anunciada Agência Nacional de Petróleos e Gás (ANPG) para Angola vai dar lugar a um saneamento financeiro no sector petrolífero, prevendo-se que a saída da Sonangol da actividade de concessão acabe com conflitos de interesses, dizem especialistas angolanos.
Em reacção à medida do Presidente da República, João Lourenço, há quem recorde a existência de dois orçamentos no Governo de José Eduardo dos Santos, bastante criticados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), enquanto outros destacam o passo para transparência na gestão de recursos.
Com a Sonangol somente na pesquisa e produção de hidrocarbonetos, o economista Francisco Paulo, professor da Universidade Católica, afirma que está a acabar, tarde demais, o que considera ser ‘’prepotência’’ num sector onde impera a figura de árbitro/jogador.
“A Sonangol tinha as suas próprias receitas, ao vender o petróleo no mercado internacional, e recebia, em nome do Estado, as receitas das concessionárias. É bom que esta agência, que deve ser tutelada pelo Ministério dos Petróleos, que não tinha expressão, receba todos os poderes da concessionária. A Sonangol fica só como operadora, como uma empresa qualquer’’, refere o académico.
Segundo o investigador, a petrolífera angolana foi responsável pela existência de dois orçamentos no país, o que levou o FMI a fazer reparos
“Especialmente no consulado do Presidente Dos Santos. Existiam dois orçamentos, sendo um financiado pela Sonangol, que fazia despesas em nome do Estado. Isto foi descoberto pelo FMI, quando, em 2009, Angola pediu um empréstimo de1,5 mil milhões de dólares para ajuda à balança de pagamentos. Fez recomendações no sentido de que todas as despesas do Estado deviam ser feitas via OGE’’, sustenta Francisco.
Também de acordo quanto à necessidade de separação de tarefas, Filomeno Viera Lopes, antigo quadro da Sonangol, salienta que o modelo em correcção serviu os interesses da franja beneficiária da acumulação primitiva do capital.
‘’Havia conveniência política em a Sonangol ficar com esses fundos todos, já que eram um canal de financiamento do crescimento de um certo sector do país, a chamada acumulação primitiva. Viu-se com a constituição do chamado Fundo Soberano, onde parte considerável foi para esta acumulação. Agora, num contexto diferente, vemos que há essa pressão do Fundo Monetário Internacional a apontar para a separação das águas, até para que Angola tenha acesso a fundos internacionais’’, considera Vieira Lopes.
A comissão instaladora para a ANPG, coordenada pelo director nacional dos Petróleos, Amadeu de Azevedo, surge numa altura em que a Sonangol reafirma que os seus eixos de actuação são o reforço da capacidade na refinaria de Luanda e a construção das refinarias do Lobito e Cabinda, mas Vieira Lopes não acredita que estes assuntos fujam das mãos da petrolífera angolana.