Cidade que é o epicentro do coronavírus foi reaberta nesta quarta após dois meses de medidas de isolamento
Para os estudantes angolanos em Wuhan, o fim oficial do período de isolamento não trouxe mudanças, já que os perigos suscitados por casos assintomáticos excluídos da contagem oficial ditam o prolongamento de restrições nas universidades da cidade chinesa.
Milhares de pessoas abandonaram Wuhan para outras partes da China, após 76 dias de bloqueio da cidade que foi o centro do novo coronavírus, mas os portões das universidades locais “continuam encerrados” e os estudantes “proibidos de sair dos dormitórios”, descreve à agência Lusa Euclides Simeão, aluno de engenharia de Ciências da Computação.
“Espero voltar a poder caminhar no ‘campus’, mas, por enquanto, continuamos retidos nos dormitórios”, diz o representante dos cerca de 40 estudantes angolanos em Wuhan, acrescentando que não há ainda data marcada para o início das aulas.
O fim de um bloqueio, sem precedentes, da cidade com 11 milhões de habitantes, e que serviu como modelo para vários países que tentam agora travar a epidemia da covid-19, constitui outra experiência inédita: retomar os negócios e o quotidiano, ao mesmo tempo que se evita uma segunda vaga de infeções por uma doença que, em muitos portadores, não apresenta sintomas.
“A escola diz-nos que há ainda os assintomáticos e, portanto, recomenda cautela, mesmo quando reabrirem os portões, e para manter a distância social, lavar sempre as mãos e usar sempre máscara”, conta Euclides.
O fim oficial do bloqueio tem um significado político importante ao permitir ao regime chinês declarar vitória na luta contra o surto, que começou no país, numa altura em que a Europa e os Estados Unidos são os novos centros da doença.
Em editorial, no entanto, o jornal do Partido Comunista Chinês alertou para comemorações prematuras.
“Este dia, esperado há muito, será naturalmente celebrado pelas pessoas. Porém, não se trata da vitória final”, nota o Diário do Povo. “Temos que nos lembrar de que, apesar de satisfeitos com o fim do bloqueio, não podemos relaxar”.
Só na quarta-feira passada é que a Comissão Nacional de Saúde chinesa começou a divulgar o número de pessoas infetadas que não têm sintomas, mas que podem transmitir o vírus. Desde então, o país reportou um total de 1.095 destes casos.
O trânsito automóvel em Wuhan começou hoje a retomar ao normal, à medida que pontes, túneis e autoestradas foram reabertas. Segundo os dados oficias, a cidade não registou novo caso de infeção nas últimas 24 horas.
A imprensa local avançou que cerca de 65.000 pessoas deixaram hoje Wuhan, de avião ou comboio. No entanto, chegadas ao destino, serão sujeitas a uma quarentena de 14 dias e a testes de deteção de ácidos nucleicos do novo coronavírus.
Para Rui Severino, um português que recusou abandonar Wuhan durante o período de isolamento, apesar da oferta de repatriamento por Portugal, o fim do bloqueio constitui uma motivação para o futuro.
“É um sentimento de grande alívio”, conta à agência Lusa o treinador de cavalos de corrida. “Já podemos ver a luz ao fundo do túnel”, diz.
Severino conta que, “sobretudo para pessoas que têm crianças pequenas [o período de bloqueio] foi bastante desgastante”, pelo que se “nota agora um grande alívio por poderem sair à rua”.
Durante o bloqueio de 11 semanas, os residentes de Wuhan foram autorizados a sair de suas casas apenas para comprar comida ou participar em outras tarefas consideradas absolutamente necessárias.
Para Euclides Simeão, o fim do bloqueio e a reabertura do ‘campus’, que deverá ocorrer nas próximas duas semanas, serviu para acalmar os estudantes. No entanto, o angolano diz que o retorno à normalidade não é aguardado com a ansiedade de outrora.
“É aborrecido, mas já nos habituámos”, descreve. “Para nós, o normal passou a ser estar em quarentena”.