Corrupção e fraca qualidade das obras são manchas nos empréstimos da China

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A China não queria saber onde é que Angola gastava o dinheiro que lhe emprestava e isso fomentou práticas menos correctas que acabaram por pesar negativamente na imagem do país asiático. Hoje as regras já são outras. Não é de apenas pontos negativos que se vive a relação de Angola com a China, embora a corrupção e a fraca qualidade das obras sejam recorrentemente citados por vários especialistas.

A relação de Angola com a China não pode ser reduzida apenas às trocas comerciais e aos financiamentos, já que milhares de cidadãos asiáticos acabaram por se instalar no País, trazendo investimento privado chinês de pequena e média dimensão, que trouxe alguma inovação e criou emprego. Para o agrónomo Fernando Pacheco uma avaliação à relação entre Angola e a China passa forçosamente pelo modo como se encaram os empréstimos chineses, que oficialmente representaram a possibilidade de financiamento da reconstrução de infraestruturas destruídas pela guerra. “Acredito que um estudo profundo da relação custo-benefício resultaria na identificação de muitos aspectos negativos.

Desde logo pela qualidade das obras, quer de estradas, quer de caminhos-de-ferro e de centralidades com que se pretendia resolver o problema da habitação. Mas esta questão tem de estar ligada a outros aspectos, como o modelo de desenvolvimento escolhido pelo governo de Angola que repousava, e ainda repousa, na priorização de megaprojectos que permitiriam a rápida modernização do país”, sublinha. Fernando Pacheco acrescenta: “o Presidente Eduardo dos Santos defendeu que Angola iria rapidamente atingir um nível de desenvolvimento semelhante aos da África do Sul e do Brasil, sem perceber que isso não seria possível sem uma aposta firme no desenvolvimento das instituições e dos recursos humanos.

Essa opção favoreceu e alimentou, e de que maneira, o florescimento da corrupção que atingiu níveis absurdos”. Para José Oliveira, também investigador do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica, e especialista em energia, a cooperação com a China acaba por ser benéfica ao País, mas poderia ser melhor “se a parte angolana tivesse sabido melhor aproveitar os financiamentos e primar pela exigência de qualidade”. Oliveira questiona, no entanto, o modelo em que essa cooperação assentou. “A China foi a única opção que Angola teve para fazer a reconstrução nacional de forma rápida de acordo com a estratégia que definiu na altura. Eu considero má estratégia porque foi 100% baseada na reconstrução por empresas chinesas sem a integração de empresas angolanas existentes. Isto fez com que após 20 anos de reconstrução nacional o País não disponha de empresas habilitadas a construir no futuro – salvo raras excepções – nos mais variados ramos da construção civil, mecânica, industrial, etc. Foi uma estratégia típica de um país subdesenvolvido comprando chave na mão e descurando a qualidade e as capacidades para o futuro”, defende.

Já o investigador económico Fernandes Wanda diz que Angola até ganhou muitas infraestruturas com estes financiamentos, tendo criado oportunidades de emprego, mas dada ” a falta de articulação sectorial, os financiamentos não foram capazes de dinamizar, de forma sustentável, a economia não petrolífera. Por exemplo, as estradas foram reabilitadas e estavam a dinamizar o comércio rural mas, na ausência de manutenção, hoje estão quase todas degradadas a precisar de novos financiamentos”. É por isso que nem só de pontos negativos vive esta relação, como afiança Fernando Pacheco, que considera que empresários chineses souberam olhar para o mercado angolano e perceber as oportunidades que o País tinha a oferecer. “Isso permitiu que percebessem a necessidade de resolver problemas concretos. Tenho referido o caso dos motociclos de três rodas que inundaram as estradas de Angola, nas áreas rurais e urbanas, resolvendo, ainda que precariamente, o drama da mobilidade da população mais pobre e até o transporte de bens e mercadorias. É essa leitura das características do mercado angolano que está a favorecer e a orientar o investimento privado chinês de pequena e média dimensão, principalmente a agricultura, na indústria e nos serviços. E a consequente criação de empregos”, disse.

No entanto, considera, “não há bela sem senão” e alerta para os relatos sobre” as violações à lei e às boas práticas que são constantes pelo aproveitamento da incapacidade das instituições angolanas”.

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