Pregação nos transportes colectivos «acende» divergência entre utentes

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Tem sido frequente o aparecimento de cidadãos afectos a diversas religiões que realizam pregações nos transportes públicos e privados em Luanda. A situação divide as opiniões na capital do país.

Uns consideram uma “boa” prática, na medida em que desperta as almas perdidas. Para outros, a realização destas pregações deve ser feita em locais próprios e “não nos autocarros, onde nem todas as pessoas se identificam com essa acção”.

Empregada doméstica na centralidade do Kilamba, Ana Victoria é daquelas senhoras que reconhece a importância da pregação nos transportes público e privado. Segundo ela, a evangelização ajuda a expulsar os demónios e promove um bem-estar de espírito.

“Eu gosto quando aparecem meninos e senhores a pregarem no autocarro. Fico muito feliz. Liberta-me dos maus espíritos. Às vezes a pessoa sonhou mal e está mal disposta, mas quando ouço pregações sinto-me aliviada e motivada”, aplaudiu, Ana, que estava a caminho do trabalho.

João Garcia, vendedor ambulante de bens alimentares na zona do Kifica, partilha da ideia da Ana ao salientar que “uma boa pregação logo pela manhã ou mesmo à tarde ajuda muito no meu bem-estar de espírito”. Para ele, a palavra de Deus não tem lugar para ser proferida, pelo que deve ser pronunciado em todos os lugares do mundo.

“Eu não vejo nenhum mal em pregarem a palavra de Deus nos autocarros. Eu sou católico, mas quando alguém fala de Deus presto sempre atenção, porque daí podem surgir coisas boas. Temos de expulsar os demónios das nossas vidas”, disse.

Já o jovem Joaquim Gabriel pensa o contrário. Segundo o jovem, a palavra de Deus não pode ser pronunciada de qualquer forma, em particular nos autocarros. Para ele, os jovens pregadores devem entender que nem todas as pessoas pertencem às suas religiões e que no autocarro ou no táxi “não é a melhor escolha”.

“Para mim, os jovens e senhores pregadores têm exagerado muito. Do jeito que falam de Deus fica tipo que eles são os únicos crentes e filhos de Deus. Se querem se parecer assim, que realizem essas pregações nas suas próprias religiões. Eu respeito a palavra de Deus, mas desse jeito não é bom”, lamentou.

Paula Augusto, estudante, defendeu que, perante esse cenário, as pessoas que praticam esses cultos devem respeitar quem não pertence ou não comunga a mesma ideologia religiosa. Para ela, deve se pautar por uma conduta religiosa mais responsável e menos ostentativa.

“Não critico ninguém por pregar a palavra de Deus. Mas, quem o faz que seja de forma mais responsável e que não precisa mostrar que ele é o único que vive da palavra. E devemos entender que no autocarro nem todo o mundo entra de bom-humor e que nem todo o mundo quer ouvir o pregador naquela hora. Isso acaba por incomodar as pessoas. Algumas pessoas exageram mesmo”, salientou a estudante.

Por fim, a estudante é de opinião que essas práticas sejam, pelo menos, proibidas nos autocarros.

Para o sociólogo Nkanga Gomes essa situação representa dois ângulos, sendo que o primeiro resulta do fanatismo religioso por parte de alguns cidadãos e, por outro lado, tem a ver com o reflexo da pobreza económica e financeira.

“As pessoas que realizam esses cultos nos transportes devem perceber que nem toda a gente é religioso. E invocando o nome de Deus em autocarros, táxis entre outros meios acaba por perturbar o silêncio dos outros”, rematou.

Por: António Gaspar

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