Kilamba sob pressão

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A Centralidade do Kilamba foi, desde o início, apresentada como um símbolo do urbanismo moderno e da nova Angola — um espaço planeado, funcional e digno, que daria forma a uma classe média emergente. Era, de certo modo, o retracto do país que queríamos ver nascer: organizado, equilibrado e socialmente inclusivo.

Contudo, bastaram poucos anos para que o sonho começasse a desfazer-se diante de nós. O que era um projecto de referência, com avenidas amplas, zonas verdes e áreas reservadas a equipamentos sociais, começa agora a perder o traço da ordem e a ganhar o contorno caótico das ocupações improvisadas.

O Kilamba planeado está a dar lugar a uma espécie de “sanzala urbana”. Nos últimos meses, surgem construções por todos os lados — muros, anexos, pequenos prédios e até edifícios erguidos em espaços antes reservados para escolas, clínicas ou centros culturais. O impulso de vedar e ocupar tomou conta de muitos, como se o território pertencesse a quem chega primeiro.

Poucos se lembram de que o espaço público é, por definição, de todos. Mais grave do que o aspecto estético é o risco de colapso técnico e social. O aumento desordenado de edificações ameaça a rede eléctrica, o saneamento básico e o abastecimento de água potável.

Edifícios são erguidos a escassos centímetros uns dos outros, num total desrespeito pelas normas de segurança e ventilação. É o retracto da pressa e da ausência de fiscalização.

Há ainda casos insólitos, como a vedação de postes de videovigilância do Centro Integrado de Segurança Pública (CISP) dentro de propriedades privadas. Que urbanismo é esse em que o interesse individual se sobrepõe ao bem comum? Que autoridade permite que câmaras públicas fiquem sob o controlo de particulares?

O Kilamba não pode tornar-se mais um exemplo da nossa incapacidade de preservar o que foi bem feito. É urgente que as autoridades municipais e urbanísticas retomem o controlo, imponham regras claras e protejam o que resta do espírito original do projecto.
O futuro das nossas cidades depende da coragem de corrigir os erros do presente.

O Kilamba que sonhámos ainda é possível — mas só se tivermos vontade de o reconstruir na mente e na prática.

Por: FERRAZ NETO

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