O anúncio da subida dos preços dos transportes foi um pesadelo para a maioria das pessoas que diariamente tem de recorrer a transportes públicos para chegar ao centro de Luanda. Rosalina Silva vive no Zango IV e acorda todos os dias às 4h50, um horário que segue religiosamente para chegar a tempo à Mutamba, onde trabalha como caixa de um supermercado, a troco de um salário baixo.
“Do bairro Sagres (no Zango IV), onde vivo até ao Zango I pago 200 Kz. Do Zango I ao desvio do Zango também 200 Kz. Depois tenho de apanhar um outro táxi para chegar até à Ponte Amarela [Vila de Viana] que são também 200 Kz. Da ponte Amarela à Estalagem e depois Congolenses e nos Congolenses já temos Mutamba, temos de pegar o táxi a retalho”, lamenta.
Os 45 Km do Zango IV à Mumba são repartidos por cinco táxis azuis e brancos diferentes, o que dá 9 Km por cada corrida e 1.000 Kz só para chegar até ao posto de trabalho. Antes da subida para 200 Kz, Rosalina pagava menos 250 Kz.
Mas não é o aumento dos 50 Kz que “mais dói, é o encurtamento das linhas que tem sido o grande problema desde a primeira subida de combustível”, em Junho de 2023, que aumentou o peso do fardo que muitos Luandenses têm de carregar.
Pode apenas ser o início de uma escalada dos preços da corrida de táxi, já que à medida que o Estado vai cortando gradualmente a subvenção aos combustíveis, os custos operacionais vão aumentar, o que significará a necessidade de reajuste da tarifa ao “sabor” da retirada do subsídio.
A medida de mitigação para o serviço de táxi anunciada pelo Governo na primeira subida da gasolina não resultou, por não haver uma cobertura aceitável na distribuição dos cartões de subsidiação dos combustíveis, o que aumentou ainda mais o encurtamento das corridas de táxis.
Na verdade, o comunicado de 14 de Maio da Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT), que determina a subida da tarifa de táxi para conformar a estrutura de custos dos operadores à subida dos combustíveis, não estabelece um mínimo aceitável de Km a ser cobrado por cada corrida, aliás define uma “extensão de até 16 Km”, deixando em aberto assim como “legalizar” o encurtamento das rotas por parte dos operadores.
Com esta “legalização” e mais a subida de tarifa de táxi, os custos diários de Rosalina subiram 33%, chegando a gastar, em média mensal, 44 mil Kz, quando tem que ir e vir de candongueiros, diluindo metade do salário só com transportes.
Em termos práticos, a funcionária do supermercado tem custos mensais com transporte muito superiores ao salário mínimo nacional, fixado em 32.181,15 Kz.
Contudo Rosalina, às vezes, usa outra alternativa para minimizar os custos, no entanto tem de exercitar a paciência.
“No regresso a casa, prefiro sair do trabalho a pé até chegar aqui ao largo Nzinga (Maculusso), onde apanho um mini-autocarro entre 500 Kz a 700 Kz que faz linha directa, mas nem sempre é fácil. Só tenho de esperar duas horas e meia”, disse Rosalina com um semblante carregado de esgotamento físico, enquanto aguardava pelo transporte para regressar a casa e ser acolhida pelos dois filhos, que estudam nas redondezas do Zango IV em escolas privadas.
“Eu já não me sinto esgotada, sinto-me desfeita e abandalhada. Estamos a viver à nossa própria sorte”, lamenta enquanto a fila de mais de duas centenas de pessoas avança devagar e devagarinho, devido à exiguidade de transporte que faz linhas longas.
João de Almeida, funcionário público há mais de 20 anos, companheiro de viagem de Rosalina Silva, disse ao Expansão que a cidade cresceu desigual com grande concentração dos serviços no centro, o que retira famílias inteiras dos seus bairros para o centro de Luanda à procura dos serviços, como educação, saúde e outros.
“Não temos infraestruturas para os transportes público, não temos empresas públicas no sector que funcionem, vai ser difícil encontrar uma solução. Temos de reinventar Luanda”, conclui o servidor público.